segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

As canções que você fez pra mim



And a stranger came running up to me, from the deck of the ship and he said, said he;
‘O are you the boy Who would wait on the quay With the silver penny and the apricot tree?
I’ve a plum-coloured fez, and a drum for thee, and a sword and a parakeet from over the sea’
‘O where is the sailor With bold red hair? And what is that volley on the bright air?’
‘O where are the other girls and boys? And why have you brought me children’s toys?
Why have you brought me children’s toys?’
Natalie Merchant - The nursery rhyme of innocence and experience.


Pensei no começo ideal para uma carta e, a certo momento, me pareceu que nenhuma das minhas conjecturas era acertada. Organizei sentimentos brilhantemente num mural de palavras escolhidas a dedo e estava ali, naquele mosaico literário, a expressão coerente e sincera de como eu me sentia. Senti orgulho daquilo, e, sentindo orgulho também fiquei triste e congestionei os olhos sem saber por que. Naquele momento me abateu um constrangimento particular e infeccioso e quando dei por mim era tarde. Entendi que havia muito pouco de você naquelas linhas, não havia a sua naturalidade ou seus defeitos, aquelas imperfeições delicadas de você. Aquelas linhas eram sobre mim. Sobre minha brilhante capacidade de organizar e descrever sentimentos. Você? Você ficou na ferramenta de acesso àqueles sentimentos e desapareceu logo que eu terminei a primeira sentença. 
Quando reli aquele pequeno tesouro da língua que falamos, reli também a superficialidade do meu ego estampado no que eu pensei considerar como uma carta de amor pra você. Percebi-me em um prédio enorme de altos cômodos e janelas amplas... que não servia pra abrigar ninguém. Dessa conclusão ressenti-me de mim mesmo, do pequeno homem que há em mim e do grande homem que eu poderia ter sido. 
Mas nada disso importa, importa que percebi com certa apatia que quando você partiu, partiu de mim também alguma coisa do recheio luminoso e quente, alguma coisa da substância que havia em mim. Assim, fiquei entregue a violência dos arbustos selvagens que crescem bravos em um outrora bem cuidado jardim. Preso ao meu ego, escravo de mim. 
No que é defeito meu, não sei ser melhor, exceto pra alguém. 
Então rasguei minha primeira carta e escrevi no meu diário. Essa carta, pra mim mesmo.

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